O processo de licenciamento ambiental da mineradora Gecal em Pains, no Centro-Oeste de Minas Gerais, tem gerado debates na região. De acordo com informações do portal Pains Últimas Notícias, na última semana, em 02 de setembro, a Câmara de Vereadores da cidade realizou uma reunião com a presença de Ana Luísa, secretária de Meio Ambiente, e Héfren Costa, Diretor Comercial da Gecal, para discutir o processo de licenciamento da área conhecida como Pedra do Cálice, adquirida pela empresa para, supostamente, realizar a extração de calcário no entorno.
De acordo com a postagem do portal, a reunião foi convocada pelo vereador Paulo de Tarso Faria (Paulinho Dicó), a reunião teve como foco principal os impactos ambientais e a preservação da região. Segundo a publicação, a secretária do Meio Ambiente afirmou que o licenciamento está em análise desde 2021, seguindo todas as exigências dos órgãos responsáveis.
Na reunião, o diretor comercial da Gecal, Héfren Costa destacou que a Gecal investiu mais de R$ 30 mil em estudos sismológicos para garantir que as operações não afetem significativamente a Pedra do Cálice. Informou ainda que a empresa propôs a criação de uma Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) na área, doando de 5 a 6 hectares para o estado, visando à preservação da vegetação nativa. Porém, quando a mineradora foi questionada pelo Programa André Show, na ocasião em que teve acesso impedido à Pedra do Cálice, a resposta foi o silêncio.
Quando a equipe de reportagem da atração televisiva exibida na TV Band Minas esteve na cidade, moradores da região, sob anonimato, denunciaram que cavernas poderiam estar sendo suprimidas pela Gecal sem os devidos estudos. Isso iria contra a legislação ambiental brasileira, que exige estudos espeleológicos e anuência de órgãos como o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) antes de qualquer supressão de cavernas, conforme a Lei Federal nº 9.985/2000. A mineradora foi questionada, porém, mais uma vez, optou pelo silêncio. A cidade está situada em uma região cárstica de grande valor geológico. O termo “carste” refere-se a um tipo de relevo cuja paisagem rochosa apresenta um aspecto de ruína, esburacado, com drenagens subterrâneas. Esse relevo é formado por rochas solúveis pela água ácida, como o calcário.
Lucélio Nativo, biólogo e espeleólogo do Espeleogrupo Pains, explica que o carste é formado por fraturas na rocha, causadas pelos movimentos da crosta terrestre. “A água de chuva, ao entrar em contato com o CO2 da atmosfera e do solo, forma ácido carbônico, que dissolve o calcário, criando as formações cavernosas e os espeleotemas”, disse.
O município também guarda outras preciosidades históricas, como pinturas rupestres e diversas outras riquezas. Em 2022, fósseis de uma preguiça gigante foram encontrados pelo Espeleogrupo Pains na Gruta João Lemos e levados para o Museu de Ciências Naturais da PUC Minas, em Belo Horizonte.
Pedra do Cálice
A Pedra do Cálice, um dos monumentos naturais mais conhecidos da região e cartão postal de Pains, tem cerca de 60 milhões de anos. A formação rochosa, que é tombada pelo município, pode estar ameaçada. A mineradora Gecal, que atua na cidade desde 1985, pretende expandir suas atividades e iniciar a extração de calcário nas proximidades do monumento natural. E foi justamente essa intenção e a forma com que o licenciamento ambiental foi liberado que chamaram a atenção acerca de como as autorizações foram obtidas e se todos os processos legais foram respeitadas.
De acordo com informações obtidas pela equipe do Programa André Show, apenas 600 metros separariam as movimentações da empresa do famoso ponto turístico. Ambientalistas e pesquisadores demonstram preocupação com o impacto da mineração tão próximo à Pedra do Cálice. Na ocasião da gravação da matéria especial em Pains, o repórter Heberton Lopes conversou com dezenas de pessoas enquanto estava na cidade e nenhuma tinha conhecimento de que o cartão-postal da cidade pode estar em risco.
O espeleólogo Lucélio Nativo alerta sobre os riscos da mineração a 600 metros do monumento natural. “Foi feito o licenciamento mas não foram realizados estudos para saber o grau de influência da proximidade da cava”, disse.
Acesso impedido
Durante a gravação de uma reportagem, o jornalista Heberton Lopes e o cinegrafista Jhonattan Nunes enfrentaram uma situação inusitada enquanto se dirigiam à Pedra do Cálice. Eles estavam transitando por uma estrada de terra a caminho do monumento natural quando começaram a ser perseguidos por um carro branco. O motorista do veículo acelerou, buzinou e ordenou que a equipe de reportagem desse meia volta imediatamente, impedindo o acesso ao monumento natural.
Recentemente, foi encaminhado um requerimento à Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável na Assembleia Legislativa de Minas Gerais solicitando informações sobre as atividades de mineração na região. O documento questiona a falta de monitoramento adequado e a ausência de estudos específicos e medidas para a proteção das cavernas e formações rochosas.
O Programa André Show procurou a Gecal por e-mail, telefone, mensagens e até mesmo presencialmente. Foi questionando o fato de a equipe ser impedida de gravar a Pedra do Cálice e perguntado se a empresa não acha arriscado realizar a extração de calcário em uma área tão próxima ao monumento natural. Como de costume, a mineradora não se manifestou.
A Secretaria Municipal de Meio Ambiente de Pains informou, por meio de nota, que cada licença emitida é precedida de uma avaliação criteriosa dos impactos ambientais potenciais do projeto proposto e que a secretaria trabalha em estreita colaboração com todas as partes interessadas para garantir que todas as preocupações sejam adequadamente consideradas. Contudo, afirmou que não existe exploração mineral nas proximidades do monumento. O Programa André Show vai continuar acompanhando a situação.
O que diz a Gecal
A mineradora foi procurada pelo Moon BH, mas não atendeu a reportagem. O espaço segue aberto.